Personagens: Mônica e Marcos
Ambiente: Um quarto de motel
Mônica e Marcos estão entrando no quarto de motel, envolvidos em beijos e abraços. De repente, Mônica se vê no espelho. Afasta-se um pouco de Marcos e pergunta.
MÔNICA - Marcos, o que você acha do meu corpo?
MARCOS - Maravilhoso, meu amor.
MÔNICA - Será que eu não engordei um pouco? Eu tô achando os meus seios maiores que o normal. Você gosta de mulher peituda ou mulher com peito normal?
MARCOS - Meu amor, eu gosto dos seus seios. São normais. Cabem na boca, é o que importa.
MÔNICA - Se você tivesse que mudar alguma coisa no seu corpo, o que você mudaria?
MARCOS - Ah, sei lá, Mônica, ainda não parei pra pensar nisso.
MÔNICA - Acho que eu queria ter uma bunda maior. Mais carne, sabe? Você não queria pegar numa bunda maior, assim, sei lá, meio Scheila Carvalho?
MARCOS - A sua bunda é boa, meu amor. O importante é que você se movimenta bem com o pouco que você tem.
MÔNICA - Você acha que eu não tenho bunda?
MARCOS - É uma bunda legal.
MÔNICA - O que é uma bunda legal, Marcos? Eu não entendo essas coisas que homem comenta.
MARCOS - Uma bunda legal é uma bunda legal, meu amor. Não tem como explicar. A sua bunda é ótima. Eu gosto. Isso é o que importa.
MÔNICA - E a minha boca? O que você acha da minha boca?
MARCOS - Ela é uma delícia. Guarda uma língua que faz loucuras.
MÔNICA - Esquece o que tem dentro da boca, a língua vem em segundo plano, todo mundo tem língua. Eu tô falando do desenho da minha boca. Como eu posso te falar...
MARCOS - Com a boca.
MÔNICA - Peraí, não interrompe o meu raciocínio. É que a minha boca parece ser... quer dizer... ela é menor do que essa linha aqui do nariz, ó. Todas as bocas passam essa linha do nariz... Quer dizer, a maioria passa. E fica legal, eu acho que fica um desenho mais bonito. A minha boca parece tão espremidinha dentro dessas duas linhas do nariz. Eu sinto a minha boca tão pequenina. Olha pra ela, o que você acha?
MARCOS - Que viagem estética é essa, Mônica? De onde você tirou todo esse raciocínio diante da linha da boca?
MÔNICA - Marcos, parece que você não entende essas coisas de mulher. Mulher não vive sem espelho. Tire um espelho de uma mulher por um dia, que você a verá enlouquecer... (vira-se e se defronta novamente com o espelho) Olha a minha perna... Eu podia ter uma perna mais grossa, né? Eu não gosto também da minha altura. 1,75 eu acho legal. Eu me sinto meio baixinha, como se eu tivesse o tempo todo uma visão de médio alcance, sabe? Olha a Bárbara. Ela é alta, elegante, tem uma bunda enorme, um pernão... Mas eu gosto do meu cabelo. Ele é meio ressecado, mas eu gosto dele. Eu acho que eu tinha que tratar melhor dele, cê não acha?
MARCOS - Eu acho que você gostaria de ser outra mulher, Mônica. Muito espelho não lhe fez bem, sabia?
MÔNICA - Pelo contrário, eu acho bom a gente se olhar, sim. A gente tem que ter uma visão global nossa, porque a mulher...
Marcos observa um traço na coxa de Mônica.
MARCOS - Mônica, que traço é esse na sua coxa?
MÔNICA – Traço, que traço? (tenta esconder)
MARCOS - Uma coisa bem na altura da... aí, deixa eu ver...
MÔNICA - Não!!! Olha, você quer saber mesmo que traço é esse?
MARCOS - Claro. Eu tô perguntando.
MÔNICA - Eu sei que você tá perguntando. (mostra rápido) Viu, viu o traço? Tá satisfeito agora? Ou quer ver outros traços, ou melhor, buracos, covas na pele da sua namorada, hein?
MARCOS - Eu não tô te entendendo, Mônica.
MÔNICA - Este “traço” que você diz, este bendito traço, é uma estria, tá legal? A minha estria de estimação! Matou a sua curiosidade? Ficou feliz, contente por saber que a sua namorada tem estrias?
MARCOS - Mas qual o mal nisso pra você fazer tanto drama?
MÔNICA - Qual o mal nisso? Você não é mulher pra saber. O que eu sei é que... é que... Poxa, não é legal você saber que eu tenho estrias.
MARCOS - Mônica, isso não importa. A gente fez um amor tão gostoso, isso não interferiu no nosso prazer.
MÔNICA - Você está dizendo isso agora. No começo não interfere, antes de casar principalmente. Depois, não. Vai caindo na intimidade. Quando menos eu esperar, você vai estar rindo das minhas estrias. Olha, Marcos, a gente precisa redefinir a nossa relação, senão, logo, logo, você estará no banheiro comigo quando eu estiver fazendo... fazendo... enfim, as coisas que todo ser humano precisa fazer. Aí, não vai dar.
MARCOS - Mônica, que tempestade em copo d’água é essa?
MÔNICA - Não é tempestade, não, Marcos. Você não é mulher. Tomara que você volte mulher na outra encarnação pra saber o quanto é doloroso ouvir o seu namorado, o seu parceiro sexual perguntando pelas suas estrias. Perde o respeito, perde o tesão.
MARCOS - Porra, que saco isso, hein?
MÔNICA - Eu não fui malhar ontem. Tô me sentindo um lixo hoje, você entende? Agora você vem e fala das minhas estrias.
MARCOS - Eu só perguntei por uma.
MÔNICA - Mas fique logo sabendo que existem outras. Amanhã vou ter que malhar dobrado, ou melhor, triplicado, quer dizer, acho que vou ficar o dia inteiro na academia pra ver se eu recupero a minha auto-estima.
MARCOS - Eu acho melhor a gente ir pra casa.
MÔNICA - É melhor mesmo. Mas tem mais uma coisa: eu não quero mais vir em motel que tenha espelho, entendeu? E se você quiser ficar comigo terá que se acostumar a fazer sexo com pouca luz. Afinal, algo precisa ser preservado. Ou isso ou o final de nossa relação. E mais: vou voltar pro meu analista. E a gente só vai se encontrar daqui a uma semana. Com licença (retira-se para o banheiro)
MARCOS - Eu só perguntei que traço era aquele. Que merda, hein?
FIM
Copyright 2001 by Raul Franco
Registrado na Biblioteca Nacional
raulfranconeto@gmail.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário