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quarta-feira, 20 de julho de 2011

Cena de Motel

  Ufa, depois de séculos, volto ao meu bloguinho de textos para teatro, cinema e TV. Ele foi abandonado por uma boa causa. Trabalho demais, gente! Mas hoje volto com o texto que gosto muito e que ainda não foi encenado também. Espero que curtam! 

 

 

 Cena de Motel - de Raul Franco



Mulher – Então, o que vai ser?
Homem – Como?
Mulher - O que vai rolar?
Homem – (sem entender) A gente ‘tá num motel...
Mulher - Eu sei. Mas eu quero saber como vai ser.
Homem - O quê?
Mulher - O barato.
Homem - Barato?
Mulher - É, como a gente vai desenrolar.
Homem - Olha, eu não sei se eu bebi de menos, mas eu não tô entendendo.
Mulher - É simples. Eu só preciso saber como vai ser o percurso da nossa transa.
Homem - Porque a gente não começa, aí você vai saber.
Mulher - Comigo não rola assim. Eu gosto de saber antes, até pra ter tudo na cabeça e depois executar. Desculpa, mas eu sou super-metódica e super-organizada.
Homem - A gente só vai fazer sexo.
Mulher - Eu sei, Paulo. Mas não é porque é sexo que tem que ser desorganizado.
Homem - Olha aqui, eu só quero transar.
Mulher - Então, vamos lá. Qual vai ser o seu percurso: boca, seio e vagina?
Homem - Hein?
Mulher - Tem gente que faz vagina direto, depois boca, seio e, se der, um pescocinho.
Homem - Não seria melhor a gente começar pra ser mais espontâneo?
Mulher – Vem ce, você curte preliminares?
Homem - Claro.
Mulher - Claro o quê?
Homem - Claro que eu curto. Eu gosto de preliminares.
Mulher - Quanto tempo?
Homem - O quê?
Mulher - As preliminares.
Homem - 10 minutos?
Mulher - Tá! Me engana que eu gosto. Meu filho, preliminar assim, de dez minutos, só em filme da Meg Ryan.
Homem - Pô, achei que a gente vinha pra cá pra transar.
Mulher – Transar?! Você não quer transar.
Homem - Claro que quero.
Mulher - Você quer trepar, que eu sei.
Homem - Não é a mesma coisa.
Mulher - Pior que não. Transar é uma coisa mais como jogo, como uma curtição gostosa. Mulheres até transam. Agora homens gostam mesmo é de trepar, como se a mulher fosse uma árvore, uma escada. Trepar já deixa implícito que um dos dois é subjugado. Você tem cara de trepador.
Homem - Tenho?
Mulher - Confessa. Não gosta de trepar.
Homem - É...
Mulher - É o quê?
Homem - Eu gosto.
Mulher - De quê?
Homem - Disso.
Mulher - Fala pra mim. Eu quero ouvir.
Homem - Eu gosto de... (fala de modo inaudível) trepar.
Mulher - Eu não ouvi.
Homem - (fala de novo de modo inaudível) Eu gosto de trepar.
Mulher - Grita pra me convencer.
Homem - Eu gosto de trepar, porra!
Mulher - Então, pega um banquinho e trepa porque eu não gosto de trepar. Eu transo. Faço amor. Trepar nunca.
Homem - Olha, vamos começar logo. Esse motel é caro pra caramba e a hora já tá passando.
Mulher - Eu não me importo com o tempo.
Homem - O que você quer, então?
Mulher - Quero saber: boca, vagina e seio ou vagina, seio e boca, ou seio, boca e vagina?
Homem - Bunda.
Mulher - Hã?
Homem - (com raiva) Eu começo pela bunda. Pode ser?
Mulher - Não começa a ficar com raiva, não. A gente só se conhece há três dias. Raiva é só com o tempo.
Homem - Já vi que não vai rolar.
Mulher - Sabe que eu adoro sexo verbal?
Homem - Pô...
Mulher - É bacana. Seguro. Não tem perigo. Do jeito que as coisas estão, é a melhor forma.
Homem - Eu gosto de meter.
Mulher - Meter, meter, meter. Penetrar é mais poético.
Homem - (raiva) Eu gosto de enfiar.
Mulher - Enfiar é chulo.
Homem - Foda-se.
Mulher - Foda-se é masturbação.
Homem – Ah, não enche!
Mulher - Quantos centímetros?
Homem - Hã?
Mulher - Fala aí. Teu pênis mede quanto?
Homem - Por que você não deixa eu pôr pra fora e aí você vê?
Mulher - Porque eu estou sem fita métrica, não tenho como precisar.
Homem - Nunca medi.
Mulher – Mentira! Todo homem mede o pau, assim como toda mulher pega um espelhinho pra ver a sua vaginazinha por dentro.
Homem - Não sabia dessa.
Mulher - Pois fique sabendo. Mas e aí, é grande ou pequeno?
Homem - Vai ficar na curiosidade.
Mulher - Já vi que é pequeno.
Homem - 19 centímetros, pronto.
Mulher - Ainda há pouco não tinha medido e agora é 19. Nossa! Deve ser 17, fala sério! Você roubou aí dois centímetros, confessa.
Homem - Não roubei nada. É 19, já disse.
Mulher - Fino ou grosso.
Homem - Grossão.
Mulher - Ih... Não vai dar. Eu sou muito apertada.
Homem – E daí? Já vi que não vai rolar nada mesmo.
Mulher - Você é acima da média dos brasileiros, né? A média não é entre 13 e 15?
Homem - Não sei.
Mulher – (mudando de assunto) Você já imaginou quantas pessoas já passaram por aqui? Milhares. Devia estar escrito na porta dos quartos: bem vindo, você é o visitante número mil e tal. Cê não acha?
Homem - Pra quê?
Mulher - Pra ter uma idéia. Também podia estar assim: aqui já foram contabilizados 910 orgasmos. Não seria legal?
Homem - E como iriam saber isso?
Mulher - Quando você entregasse a chave do quarto na saída, o cara devia perguntar: foram quantos orgasmos? Aí, você responderia: 2. Aí, ele: boa noite e voltem sempre. Olha que barato!
Homem - Aretuza, você pode me dizer uma coisa?
Mulher - Digo.
Homem - A gente não vai trepar, né?
Mulher - A gente pode...
Homem - Por favor, não venha com gracinha. Responde.
Mulher - Sinceramente?
Homem - Fala.
Mulher - Eu tô naqueles dias.
Homem - Você tá... menstruada, é isso?
Mulher - Não. Eu tô naqueles dias em que a mulher tira para infernizar a vida dos homens, provando que eles são apenas cachorrinhos babões!
Homem - Você tá brincando com a minha cara, é isso?
Mulher - Na verdade, eu tô.
Homem - O quê?
Mulher - Você foi o escolhido para participar da pegadinha do IBGE. Olhe para a câmera que está ali no alto e sorria.
Homem - Pegadinha do IBGE? Que porra é essa?
Mulher - Sim, pegadinha do IBGE que comprova a estatística enorme de que o sexo só acontece quando a mulher permite. Ou seja, a mulher é quem decide sempre com quem e o momento de fazer sexo. O homem, por outro lado, transa a qualquer momento, desde que encontre alguém que estale o dedo pra ele. Obrigada pela sua participação e até a próxima.
Homem - Peraí. E a gente não vai trepar?
Mulher - Aí, não pode. As câmeras do IBGE não podem captar imagens assim de um sexo voraz.
Homem - Se você quiser a gente faz um sexo delicado.
Mulher - Pois é, eu não quero. Desculpa. Hoje não vai dar. Tô com uma dor de cabeça terrível. Mas toma esse cartão.
Homem - O que é isso?
Mulher - O número de uma casa de prostituição. Liga pra lá. Lá é o único lugar em que o homem decide a hora de ter sexo. Agora, deixa eu ir, porque tenho que dar continuidade a pesquisa. Bye! Ah, deu 69 reais a sua conta. Vai pagar com cheque ou cartão?


FIM