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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

A Arte em Mim - Raul Franco



Sempre brinquei, dizendo que se eu fosse só ator já teria desistido há muito tempo. Não desmerecendo o trabalho do ator, pelo contrário. Mas entendendo a trajetória árdua e as dificuldades da carreira. 

O prazer de ser ator é algo que não consigo explicar em palavras. E tenho muito carinho por esse trabalho. Tanto que me dedico a ele há mais de duas décadas. É claro que depois que vim morar no RJ - e lá se vão 17 anos - a dedicação passou a ser total. Eu, paraense nato, que já fazia teatro em Belém desde 1984, quando encenei o Saci Pererê no meu colégio, vim para a Cidade Maravilhosa buscar espaço onde eu pudesse mostrar a minha arte.

Logo que cheguei por aqui, o objetivo era poder estudar, aprender técnicas, me aprimorar. Não queria que meu trabalho de ator fosse apenas intuitivo. Uma carreira não pode se enfiar apenas nisso. E eu queria poder ver todas as peças que estavam em cartaz. Para ver o que estavam fazendo, aprender com o olhar. Minha sede de espectador era enorme. E tive a sorte de em 4 dias de Cidade Maravilhosa estar ensaiando um infantil com uma galera jovem. 

Pois bem, isso é o começo, ou melhor, quase o começo de tudo. Então, retomo o frase que falei no início do texto: "se eu fosse só ator já teria desistido há muito tempo". Aí entra minhas outras funções. Porque sempre pensei na arte como forma de me expressar, dizer o que eu estava sentindo. Minha ligação com meu ofício vem de uma necessidade absurda de comunicação. Aí entra o autor. Porque sempre escrevi meus textos. O primeiro poema veio com 11 anos. Depois veio a adaptação de textos lidos em sala de aula para o teatro. E não parei mais. 

Agora um parêntesis importantíssimo. Quero contar algo que fiz. Eu já roubei. Sim, roubei. Mas não me condenem. Eu era criança. Sei que foi um ato inocente. E preciso desabafar aqui. Uma vez fui a uma livraria com a minha mãe. Não sei se o ano era 1984 ou 1985. Eu devia ter 10/11 anos. caminhando com ela, passei por uma sessão de livros infantis. E tinha um livro que era uma fábula. E uma coisa que achei curiosa é que vinha junto desse livro uma versão em formato de livrinho com a mesma história. Eu tirei do plástico. E não resisti. Aquilo me convidava para um roubo. Era tentador. Sei que, de repente, eu poderia pedir para minha mãe comprar, mas aquilo tinha cara de brinde. Coloquei no bolso e saimos da livraria. 

Eu li o livro. E melhor ainda, gostei tanto da história que resolvi fazer uma peça. Não lembro bem o nome do livro. Mas contava a história de um rei que não tinha orelha. Eu reuni os meus amigos do colégio. Começamos a ensaiar. E um dia, quando a peça estava pronta, eu pedi para a professora para apresentar no finalzinho da aula. Coisa que depois passei a fazer com frequência. Meia hora final da aula era reservada para as minhas peças. E assim comecei a criar. 

Ufa, depois desse desabafo, que eu espero que vocês tenham me perdoado, prossigo na minha história.

O trabalho do autor sempre foi forte na minha vida. Comecei brincando de adaptar para o teatro os textos que eu achava legal. Na faculdade foi a mesma coisa (eu me formei em Ciências Sociais). E escrever pra mim é quase como uma função vital: respirar. Nunca me vi sem escrever. E isso complementa bastante o meu trabalho de ator.

Algumas vezes que foi difícl viver como ator, o autor me ajudava a sobreviver. No meu segundo ano de RJ consegui montar o meu primeiro texto para os cariocas verem. Tratava-se do Casal Consumo - que sempre digo que foi o texto que me ensinou a escrever para teatro, porque ele tem várias versões e sempre eu estava modificando alguma coisa. Era escrever e experimentar em cena. Comecei a fazer a peça em 1998 e só fui parar de fazer em 2005. Em 2013 ela ganhou nova versão em SP, com o nome de Amor, Brigas e Novela das 8. 

E além do trabalho de autor, ajudando no trabalho do ator, tem o meu trabalho de diretor. E essa trinca pra mim sempre foi fundamental, me ajudando a ver a arte de uma maneira global. Em Belém eu já dirigia minhas coisas desde o tempo do colégio. Na Faculdade de Ciências Sociais prossegui. E no Rio, no meu segundo ano, eu já estava dirigindo o Casal Consumo. E sempre procurei conciliar essas 3 funções. E com o trabalho de diretor, eu aprendo muito em relação a atuação. Ou seja, é uma forma de eu olhar para o ofício do ator, estando em outro plano.

E para arrematar isso tudo, vem o que eu aprendi de produção. Afinal, para montar minhas próprias coisas, tive que meter a mão na massa e aprender a produzir na marra. Muitas vezes foi necessário produzir para continuar trabalhando. Porque nunca fui o tipo de ator que espera um telefonema de alguém, oferecendo trabalho. Sempre pensava naquilo que eu queria fazer e corria atrás. E assim segui na carreira.

Muita coisa, né? Isso porque estou falando de modo resumido. Mas vocês viram que acabei circulando em muitas funções para dar prosseguimento ao meu trabalho no campo da arte. Como ator, produtor, diretor e autor. É claro que em vários momentos, fiquei mais em uma função. Uma época eu dirigia mais, em outra, atuava mais. Escrevendo e produzindo sempre. Quando eu estava mais dirigindo, alguém me ligava para chamar para um trabalho de ator e dizia: "Vem cá, Raul, você ainda atua ou só dirige agora?" E eu sempre achava a pergunta boba, porque pra mim era impossível pensar em não atuar. Faz parte da minha vida. Não é uma aventura. 


Agora pra complicar um pouco ou até dar mais elementos para a discussão da minha arte, a partir de 2005 eu enveredei para o trabalho da comédia e potencializei o comediante que havia dentro de mim. Comecei a fazer shows de humor, que é completamente diferente de uma peça de teatro. Montei minha própria companhia, Os Fanfarrões, e não parei mais. E até como comediante, não tenho uma linha única de trabalho. Faço stand up comedy, personagens e pantomimas. E o humor físico se tornou uma marca do meu trabalho. E tudo isso vira a loucura que eu sou. Porque penso em piadas o tempo todo. Penso em músicas engraçadas. Penso em gestos que posso fazer em determinadas cenas. E isso me instiga e alimenta. 

Gosto muito do que eu faço. E não consigo me ver, fazendo apenas uma coisa. Gosto dessa pluralidade da arte. Porque tem a ver com a minha personalidade também. Às vezes, eu mesmo me pergunto se sou mais ator ou comediante. Porque outra coisa que é peculiar no meu trabalho é que faço comédia e também faço drama. E acredito que circulo bem entre esses dois gêneros. O que é raro. E sempre procurei também fazer as duas coisas. para não perder a veia de cada um dos gêneros. 

Em 2014 vão estrear alguns novos textos meus. Dirigidos por outras pessoas. Eu devo dirigir uma nova peça. Devo, em breve, circular com o meu show Risotril. E quero matar a saudade de estar no teatro, fazendo uma peça como ator. E sei que vou conseguir. Minha alma tem sede.

Mas é isso! Como diria Renato Russo, busque informação sempre. Se você é artista, procure saber sobre tudo. Leia bastante. Porque livros devem nos instigar e nos ensinar outros mundos. Cultura nunca é demais. E, obviamente, tenha um pouco de sorte. Abraços!

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013




Protesto 
de Raul Franco

Jovem se arruma para sair. Ele está de bermuda e uma camisa com o símbolo do batman. Passa pelo amigo a caminho da porta da rua.

Amigo 1 - E aí, brou, vai pra onde?
Amigo 2 - Vou protestar contra a Yoani Sánchez.
Amigo 1 - Tá maluco?
Amigo 2 - Por que? A gente tem que se manifestar. E eu vou lá mostrar...
Amigo 1 - Não, cara. Tira essa camisa do Batman. Isso é uma coisa norte-americana. Não faz sentido.
Amigo 2 - Ih, cara, não tinha nem reparado. É mesmo.
(começa a tirar a camisa)
Amigo 1 - Põe essa aqui. (dá uma camisa toda surrada, suja e com alguns buracos)
Amigo 2 - Melhor. (ele veste a camisa) Agora sim, tô pronto... (vai sair)
Amigo 1 - Peraí... De Reebok, cara? Ninguém vai te dar credibilidade. Põe umas havaianas, daquele modelo simples, é mais povão que não teve acesso aos meios de consumo elitizados. Todo mundo vai valorizar o teu gesto.
Amigo 2 - Isso aí. Boa... (tira o tênis e põe a sandália) valeu mesmo, cara! Acho que tá ok agora. Vou nessa...
Amigo 1 - Opa... peraí. Mostra o que tem no bolso.
Amigo 2 - No bolso?
Amigo 1 - É, pode mostrando...
(Amigo 2 tira um Iphone do bolso)
Amigo 1 - Porra, Ernesto, tá de sacanagem? Iphone? E vai protestar contra a blogueira cubana? Parei com você. (amigo se afasta)
Amigo 2 - Cara, alguém pode me ligar... Porra, quer saber? Vou protestar na Internet. É mais fácil.

FIM

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013


Hoje retomo esse meu blog. Estava mais abandonado do que um pinto no lixo.

E retomo com o texto inicial de um espetáculo meu chamado Casal Consumo, que fiz durante muito tempo. E ele tem várias versões, porque mexe com assuntos da mídia do momento, de coisas que saem na imprensa, etc e tal.
Mas o texto inicial é o mesmo. E foi escrito em 1998. E divido agora com vocês.

Trecho do Ca$al Con$umo, de Raul Franco


Cena inicial - música dançante, depois, Casanova, do Ritchie. Edgar e Maria Antônia estão dançando, como se estivessem em uma boate. 



EDGAR - Na vida é assim, quando menos se espera, acontece um encontro. Os dois se olham. Vem o desejo da aproximação, o calor, a vontade de se falar, mesmo sem saber o quê.
MARIA - É como se aquela pessoa que despertou a sua atenção, fosse única, fosse a pessoa que você sempre procurou em toda a sua vida.
EDGAR - Então, é pegar ou largar, pois, sem mais nem menos, você pode perder a grande oportunidade de estar ao lado da pessoa com quem você sempre sonhou esse tempo todo.
MARIA - Aí, não tem jeito! É paixão, é loucura, é cegueira momentânea. Mas faz parte da ânsia das emoções. E Edgar...
EDGAR - ...e Maria Antônia...
EDGAR e MARIA - ...sabiam disso. E não desperdiçaram o encontro de suas vidas...

Aumenta a música.

EDGAR - Oi, você por aqui?
MARIA - Eu por aqui. Quem é você?
EDGAR - Você não me conhece. Mas eu sei quem você é. Eu te vi sexta-feira passada, lá em Copa.
MARIA - É, eu caminho por lá.
EDGAR - Quando a vi, eu disse: ainda vou encontrar essa pessoa de novo. E encontrei.
MARIA - Que sorte, hein?
EDGAR - Destino. Você acredita em destino?
MARIA - Deveria acreditar?
EDGAR - E almas gêmeas?
MARIA - O que é que tem?
EDGAR - Você acredita em almas gêmeas?
MARIA - Não sei. Não tenho uma opinião formada.
EDGAR - Eu também.
MARIA - Você também não tem opinião formada?
EDGAR - Não, eu também acredito que você é a minha alma gêmea.
MARIA - Mas espera aí, eu não disse nada.
EDGAR - Não precisa dizer. Basta sentir. É coisa de energia, de espiritualidade. Tem a ver com reencarnação, da busca pela sua outra metade, da junção das partes iguais, entendeu?
MARIA - Poxa, você é sempre assim, visceral?
EDGAR - Acho que não sou.
MARIA - Visceral?
EDGAR - Não, acho que não sou o que você procura. No fundo, eu me enganei. Vou sair pra dançar, dar um tempo, depois eu volto. Tchau! (ameaçando ir)
MARIA - Espera.
EDGAR - (à parte) Isso nunca falha.
MARIA - Como é que é esse negócio, assim, de alma gêmea?
EDGAR - Gêmea, igual.
MARIA - Hã...
EDGAR - Eu sou o que você procura e você é o que eu procuro.
MARIA - Nossa! Isso é profundo. Fiquei até baratinada.
EDGAR - Olha, pode parecer loucura o que vou lhe dizer, mas tenho que dizer: eu quero casar com você.
MARIA - Casar?
EDGAR - É, a gente não pode se perder de vista outra vez. Temos que casar, construir um lar, uma família...
MARIA - Espera. Eu tô meio confusa. É que eu saí de casa, pensando em ficar só.
EDGAR - Numa sexta à noite?
MARIA - E daí? “A solidão é uma coisa boa. Só que precisamos de alguém para nos dizer isso”. Me diz?
EDGAR - Agora?
MARIA - Não. Me deixa dançar um pouco pra pensar.
EDGAR - Eu espero.

Maria Antônia começa a dançar de maneira totalmente louca. Edgar olha um pouco, depois fala.

EDGAR - Qual é o seu nome?
MARIA - Maria Antônia. E o seu?
EDGAR - Edgar.
MARIA - A gente se vê, Edgar. Tome o meu cartão. Mas ligue “djá”.

A música fica de fundo.

EDGAR - Ligarei.



quinta-feira, 5 de julho de 2012

O Julgamento do mau ator

Finalmente de volta ao meu blog Entrelinhas. Confesso que estava com saudade. E hoje volto com um texto que gosto muito. Semana que vem nos vemos de novo (ou não - risos).

O JULGAMENTO DO MAU ATOR – de Raul Franco

Voz em off: Enquanto isso, no Tribunal de Justiça, acontece o julgamento de uma importante figura da atualidade, um ícone dos nossos tempos: Marcos Resteler. E, é claro, por se tratar de uma estrela da mídia, todo o julgamento será transmitido em cadeia nacional, agora, nesse momento. NO AR: O Julgamento.

Abre-se um foco na cara do ator modelo que está tenso. Música tensa. Aos poucos, vai-se iluminando o palco todo. E logo encontramos o juiz que dará início ao interrogatório.

Juiz – Então, aqui está Marcos Resteler, 25 anos, solteiro e praticante de esportes. Ah, antes de mais nada, vale ressaltar que a sua profissão anterior era modelo. Mais um modelo que quis virar ator...
Marcos – Não é bem assim, é que...
Juiz – Por favor, não me interrompa. Deixa eu terminar o meu bife. Pois bem, quer dizer que você quis virar ator? Até aí tudo bem. Mas começar como amigo do protagonista da novela das oito? Você não começou muito em evidência, não? Será que você em nenhum momento pensou que não tinha competência para isso? Será que você não se envergonha de invadir os lares brasileiros todos os dias com uma interpretação medíocre? Você acha que só porque sabe falar pode ser ator? Hein? Hein? Agora pode falar.
Marcos – (com uma dicção péssima) Bem, na verdade, eu não sabia que a coisa era assim tão difícil...
Juiz – O que é que você disse?
Marcos – Eu disse que eu não pensava que fosse tão difícil ser ator...
Juiz – Nossa! Que dicção é essa? Nem falar você sabe, meu filho. Olha, vê se pega o kit que está aí perto de sua cadeira. (Marcos pega o kit) Por favor, tire a rolha e coloque na boca.
Marcos – O quê?
Juiz – A rolha! Pegue a rolha e coloque na boca.
Marcos – Pra quê?
Juiz – Pra articular melhor, meu filho.
Marcos – Ah... (coloca a rolha na boca)
Juiz – Agora diga o que você falou anteriormente.
Marcos – (com a rolha) Eu disse que eu não pensava que atuar era assim tão difícil.
Juiz – Mesmo assim resolveu aceitar o convite para ser ator?
Marcos – Eu sou um batalhador.
Juiz – Batalhador o escambau. Vamos ser transparentes, o que eu quero saber mesmo é quem foi o culpado de colocar você dentro do núcleo principal da novela das oito? Porque, no fundo, você não tem culpa. Você é apenas o bode expiatório de toda essa mamata que beneficia jovens sem talento.
Marcos – Mas eu sou bonito.
Juiz – Beleza não põe mesa.
Marcos – Eu sei.
Juiz – Então, reflita e responda conscientemente sobre os fatos. Não estou aqui para ladainhas. Pela última vez diga quem colocou você na novela das oito?
Marcos – Eu não sei. (cai a rolha) Eu caí de pára-quedas.
Juiz – Você caiu muito mal. E o que é pior: em um pântano cheio de crocodilos famintos.
Marcos – Não entendi a metáfora.
Juiz – Você é um bode expiatório.
Marcos – Eu sou um ator.
Juiz – Você é um oportunista. Você não é ator nem aqui nem na China. Você já fez teatro?
Marcos – Eu vou ao teatro.
Juiz – E eu vou a concertos e nem por isso subo ao palco para tocar piano. Percebe?
Marcos – Você tem razão.
Juiz – E você não tem talento. Talento... Sabe o que é isso? Você não tem técnica, você não tem nada.
Marcos – (quase chorando) Eu tenho força de vontade.
Juiz – E a gente tem que ter paciência para aturar um canastrão como você?
Marcos – Eu me esforço... Eu decoro os textos que me dão.
Juiz – Ai, meu Deus, dai-me paciência com a mediocridade. VOCÊ NÃO É ATOR!!!
Marcos – Eu não tenho culpa.
Juiz – E a culpa é de quem?

Marcos faz uma pequena pausa. abaixa a cabeça. luz diminui. Quando ele levanta a cabeça, um foco abre em seu rosto e entra uma música tensa.

Marcos – Do diretor.

Volta a luz normal.

Juiz – A-háaaa!!! A culpa é do diretor.

 Abre-se um foco no diretor que se encontra sentado em uma outra cadeira. Some o foco em Marcos.

Diretor – Eu não tenho nada a ver com isso.
Juiz – Mas foi o próprio Marcos Resteler quem falou.

Diretor – Ele fala coisas sem pensar.

Juiz – Ele fala coisas sem pensar, ele atua sem poder... Então, a gente quer acabar com isso. Essa CPI do Ator Despreparado está servindo para apontar os culpados dessa abertura do mercado para jovens sem o mínimo talento. Porque se a gente não frear isso a tempo, logo veremos uma escola de interpretação com o nome de Paulo Zulu. E ainda iremos assistir a uma novela com um elenco inteiro composto por Ciganos Igor. Percebe o que o futuro nos reserva?
Diretor – Eu sei.
Juiz – E você, Daniel Carvalho, um diretor de renome, profissional competente, está sendo apontado como um dos culpados. Isso é lamentável!
Diretor – Mas, na verdade, a culpa não é minha. Eu fui obrigado a aceitar a presença de Marcos Resteler no elenco. Eu nem o conhecia. Me disseram que ele era modelo e superbatalhador, que decorava rápido, etc e tal...
Juiz – “Me disseram” é muito vago. Eu quero nomes.
Diretor – Tudo bem, tudo bem. O culpado é... (luz baixa. foco no rosto do diretor) o autor. Foi ele quem exigiu a presença desse rapaz no núcleo principal da novela. O personagem do amigo do protagonista foi escrito pelo autor.
Juiz – Eu não consigo entender isso. O Marcos Resteler é amigo do protagonista, mas nos últimos capítulos o protagonista não apareceu uma vez sequer, sendo que o amigo estava em todos os blocos, dialogando com feras da televisão. E o que é pior, gaguejando. Como o senhor explica isso?
Diretor – (grita) A culpa é do autor . Perguntem a ele.

Foco no autor que está sentado em outra cadeira.

Autor – Eu?!?! Claro, eu conheço o Marcos Resteler, mas acontece...
Juiz – Acontece o quê? O diretor disse que você exigiu a presença dele no elenco. Você escreveu o personagem. E esse mesmo personagem está se tornando praticamente o protagonista da novela. Como você, Agnaldo Braga Gomes, um autor respeitado no Brasil inteiro, aclamado pela crítica, premiado no exterior, comete um ato desse, totalmente criminoso? E o público, coitado, é quem sofre com uma atuação ruim, canastrona. Como o senhor explica isso?
Autor – Ele é bonito, quase um Allain Delon.

Murmúrios.

Juiz – Silêncio, por favor. Vamos ouvir o senhor Agnaldo Braga Gomes.
Autor – A beleza dele é encantadora. Eu pensei que poderia torná-lo um ator de sucesso. Eu pensei que o público poderia gostar de ver um rosto bonito como o dele na televisão. E hoje sei que só isso não basta.
Juiz – Só hoje o senhor percebeu isso?
Autor – Quer dizer, eu já sabia. Mas fingi não saber. Quis dar murros em ponta de faca. Exigi a presença do Marcos Resteler na minha novela. E fui muito criticado por isso. E estou sofrendo com a decisão que tomei.
Juiz – E por que ainda o mantém no elenco?
Autor – (pausa) Eu o amo!

Murmúrio mais intenso.

Juiz – Silêncio, silêncio!!! (marteladas) Não entendi o que o senhor disse.
Autor – Eu disse que eu o amo.

Marcos Resteler leva a mão ao rosto e abaixa a cabeça.

Juiz – Você o ama? Foi por amor? O senhor, por acaso, vive uma história de amor com ele? Vocês criaram laços de família, é isso?
Autor – A gente ‘tá junto há dois anos. E eu quis dar esse presente a ele. É um presente de aniversário, meu Deus! Que culpa tenho eu de amar o Marcos e querer agradá-lo?
Juiz – É isso, meus senhores. Tudo depende de Q. I. – Quem Indica. Mas estamos aqui para acabar com isso. Então, caro autor, você só será absolvido se voltar para casa e escrever um capítulo no qual o personagem de Marcos morre.
Autor – Nunca!!! Tudo menos isso. Não matarei o personagem que escrevi com tanto carinho para ele. Eu o amo!

Marcos chora emocionado.

Juiz – Então, só nos resta condená-lo... à pena de morte por ter cometido o crime de escalar um ator despreparado para a novela das oito.

Vozes altas.

Juiz – Levem-no para a forca.
Autor – (aos berros) Morrerei por amor, por amor.
Juiz – Os outros acusados podem se retirar.
Diretor – (gritando) CORTA!!!

Todos olham assustados.

Diretor – (sem graça) Desculpem. Força do hábito.
Juiz – (olhando com reprovação para o diretor) Sessão encerrada. E, pelo amor de Deus, sumam com esse ator da minha frente.

FIM

terça-feira, 8 de maio de 2012

Micareta é que nem chupeta - de Raul Franco



A cena começa com um mix de quatro ou cinco músicas de axé e algum som de algazarra para dar o clima da micareta. Casal dança empolgado. Mas a partir da quarta música vê-se que a mulher continua sorrindo e o homem já demonstra um certo desconforto. Depois eles dão uma pausa para tomar uma água de coco.

Mulher – Que delícia, amor!
Homem – A água?
Mulher – Não. Nós dois curtindo mais uma micareta juntos.
Homem – Ô...
Mulher – Essa é a quinta, amor! Cê tem idéia disso?
Homem – Agora sim.
Mulher – Nem acreditei quando a gente começou a namorar e eu te convidei pra ir numa micareta comigo. Você na mesma hora topou. E foi lindo, amor! Você pulando que nem um pião desgovernado e eu berrando que nem um trombone desafinado. (gargalha de modo eufórico) O Chiclete com Banana tocando e a gente no maior clima “love story”, amassados no meio da multidão. E acabamos caindo no meio daquela galera eufórica. Mas nem nos importamos. Levantamos e fomos atrás do trio, bebendo smirnoff ice. Olha que coisa!
Homem – Que coisa mesmo!
Mulher – E hoje é a nossa micareta de número cinco. E quase que a gente perde a promoção dos abadás. Já pensou? Eu nem titubeei, saquei o cartão de crédito e comprei os nossos abadás por 150 reais.
Homem – 150 reais?!
Mulher – Cada um.
Homem – Mas você não me falou isso!
Mulher – Uma pechincha, amor. Depois a gente acerta. E quer saber, tem uma hora que a gente tem que ligar o foda-se porque o que vale é a alegria.

(Entra uma música muito animada e a mulher sai pulando. Homem vai atrás, pulando com a cara séria. A mulher por outro lado, fecha os olhos e berra os versos da canção. Está na cara que ela está se divertindo mais do que ele. De repente, ela pára. A música fica de fundo)

Mulher – Ai, já estou meio cansada!
Homem – Eu também!
Mulher – Isso cansa, né?
Homem – Micareta?
Mulher – Não. Micareta não me cansa nunca! Eu quis dizer que eu estou cansada agora de tanto pular. A gente tá há quatro horas aqui, pulando sem parar.
Homem – Caraca, já se passou tudo isso? Quatro horas com a gente pulando?
Mulher – E é só o primeiro bloco. Ainda tem mais 3 e o encerramento com o trio da Veveta. Olha, se eu der uma paradinha rápida, juro que agüento mais quatro horas.
Homem – Mais quatro horas disso?! Olha, Lúcia, espera um pouco.
Mulher – O que foi?
Homem – Eu preciso te dizer uma coisa!
Mulher – Que coisa?
Homem – É que...
M – Não vem me dizer que você quer voltar pra casa? Palhaçada, né?
Homem – Não. Quer dizer... é que eu...
Mulher – Hello, amor! Esses abadás custaram muito din-din. Entrei no meu limite por causa desses abadás. Então, a gente tem que aproveitar até a última gota de suor.
Homem – É justamente isso!
Mulher – Isso o quê?
Homem – Eu não quero mais gastar nenhum suor com micaretas.

(Cessa a música)

Mulher – Como assim?
Homem – Olha, eu preciso te confessar uma coisa: eu odeio micareta.
Mulher – Amor, cê tá passando mal. É o calor, né? Ah, já sei, tá precisando de (canta) “água mineral, água mineral, do candeal, você vai ficar legal”. Vou pegar uma água.
Homem – (segurando a mulher pelo braço) Pára com isso, Lúcia. Eu tô falando sério.
Mulher – Como você não gosta de micareta, Afonso? Tá me tirando! Essa é a nossa quinta e a gente sempre pulou junto. Chegamos a ganhar a faixa de casal mais animado do carnaval da Bahia de 2008. Um feito na nossa vida!
Homem – Não me lembra isso! Eu não queria te magoar, te contrariar. E quando a gente tá apaixonado a gente comete essas loucuras.
Mulher – Peraí! Stop now! Micareta não é loucura!
Homem – Eu não agüento mais isso, Lúcia, pelo-amor-de-Deus. Esse clima de alegria constante, de eterna festa. Nunca entendi como as pessoas podem ser tão felizes, pulando 4, 8 horas seguidas, cantando versos de canções pueris. (canta) “Eu quero mais é beijar na boca, eu quero mais é beijar na boca”.  
Mulher – Eu não tô acreditando Afonso! Você não quer mais?
Homem – Beijar na boca?
Mulher – Não! Curtir micaretas comigo.
Homem – Há muito tempo eu queria te dizer isso, Lúcia: detesto micareta com todas as minha forças. Eu sou fã de Rolling Stones, porra. Prefiro o Mick Jagger rebolando sessentão a ver aquele cara do Chiclete com Banana cantando: “Cara, caramba, cara, caraô, vem viver o verão, vem curtir salvador”. E não quero curtir salvador, muito menos com esse cara azucrinando o meu ouvindo com esses versos pobres. Quer dizer, são mais que pobres, são versos indigentes. (Aos poucos a mulher vai mudando a expressão, como se cada frase dele fosse um terremoto emocional no seu coração). Só a bandana desse cara tem 50 anos. Imagina ele! Olha, desculpa, mas hoje eu tô desabafando. Não posso compreender essas pessoas insanas. Pessoas que ainda estão descobrindo as vogais: aê, aê, aê / ê, ê, ê/ ôôôôôôô”. E esse fedor de mijo insuportável? Como alguém agüenta isso?
Mlher – (quase chorando) Não fala assim. Eu amo micareta, tá? Micareta é minha vida! E você foi muito falso me fazendo acreditar que gostava de micareta, seu pinóquio! E eu boba, acreditando que tinha encontrado minha alma gêmea. Isso é para eu aprender!
Homem – Olha, Lúcia, por estar gamadão em você, eu fiz esse sacrifício, mas não posso mais conviver com essa mentira. Fui desonesto, fui, mas por uma boa causa. E essa é a quinta vez que eu me sinto um peixe fora d’água. Isso pode me dar uma úlcera!
Mulher – Não vou deixar você destruir a minha micareta.
Homem – Eu quero ficar muito com você. Mas se você me ama de verdade você vai ter que optar: ou eu ou a porra dessa micareta.
Mulher – Afonso, sacanagem você querer acabar com minha festa! E pára de me  empurrar contra a corda.
Homem – Parede!
Mulher – Hã?
Homem – A gente diz: “contra a parede”. Empurrar contra a parede, essa é a expressão!
Mulher – Parede, corda, não me importa. O que sei é que eu amo micareta. E há muitos anos sou freqüentadora assídua de micaretas. Ganhei um certificado de mulher-micareteira que mais micaretas foi num ano. Você sabe o que isso significa? Foi um momento de glória na minha vida. Então, como posso largar essa coisa que sempre me encheu de alegria? Desculpa, mas não posso.
Homem – Lúcia, micareta é que nem chupeta. Até uma certa idade a gente entende, depois fica constrangedor.
Mulher – Quer saber, Afonso. Eu não posso ficar com você se você detesta micareta. E se você detesta micareta, com certeza você não pode ser minha alma gêmea. (começa a tocar a música de Ivo Pessoa: Uma vez mais – tema da novela alma-gêmea). Então, acho que cada um deve seguir o seu caminho. E atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu. Eu vou. E quer saber: você, pra mim, morreu! E saiba mais ainda, Afonso, que numa micareta eu tenho 80% de chances de encontrar alguém melhor que você. Adeus porque não vou deixar ninguém destruir uma micareta que está apenas começando. (seríssima) Alaô, alaô, mesmo com dor, eu vou me embora pra Salvador! (sai)

Afonso fica parado, sem acreditar na decisão da Lúcia.

Homem – Fui trocado por uma micareta, essa festinha barata de pessoas insanas, suadas e sem nada na cabeça. Como é que eu pude aguentar cinco micaretas sem me rebelar? Por pouco eu pensei que ia ser alistado. E a Lúcia colecionando esses abadás horrorosos. E o que são os abadás? Um pedaço de pano, normalmente colorido, abóbora, azul, verde, e tudo muito fluorescente. Pra quê? Pra sinalizar que você é mais um idiota no meio da multidão.
Voz em Off: E agora, galera animada! Pra tirar de vez o pé do chão, Ivete Sangalo e Cláudia Leite dividindo o mesmo trio. Aplausos pra elas!

Homem – E ainda por cima essas cantoras baianas estão dando cria! Estamos perdidos!

Afonso tenta ir embora e aparece outra mulher, dançando. Ele fica boquiaberto com a beleza da mulher. De repente, ela vai até ele.

Mulher 2 – Oi?
Homem – Oi.
Mulher 2 – Beleza?
Homem – Beleza pura!
Mulher 2 – Será que você tem um fogo pra acender o meu cigarro?
Homem – Desculpa, mas eu não fumo.
Mulher 2 – Nem eu. Mas numa micareta a gente faz coisas que nunca pensamos em fazer.
Homem – Ô... eu que o diga!
Mulher 2 – De qualquer forma, valeu.
Homem – Espera. Tá sozinha?
Mulher 2 – Vim com uma galera aí, mas a gente acabou se perdendo. Ah, depois a gente se encontra perto da corda. Aliás, você é bem parecido com aquele cordeiro ali. (aponta para um ponto na platéia). É seu irmão? (risos)
Homem – Não. E, graças a Deus, também não sou cordeiro. Aliás, que coisa bizarra, né? O cordeiro, o cara que segura corda! Função bosta, né? (os dois riem) Olha, não é uma cantada, mas tenho que dizer que você é linda!
Mulher 2 – Hum! Obrigada. Mas não sou tão linda quanto a Cláudia Leite. Você gosta dela?
Homem – Da Cláudia Leite?
Mulher 2 – Sim.
Homem – É... (olha pro lado e disfarça) Amo, amo Cláudia Leite.
Mulher 2 – A mulher teve filho e manteve o corpão!
Homem – Ela é demais! Dá-lhe, Cláudia! (demonstra uma animação, dançando com sorriso na cara, tentando se enturmar) Você também deve ser fãzona da Cláudia Leite, né?
Mulher 2 – Detesto.
Homem – (pára de dançar) Como?
Mulher 2 – Não gosto mesmo. Acho forçada!
Homem – Ah, tá... é... às vezes, ela é forçada mesmo, concordo. (dança de novo) Então, você deve gostar da Ivete, né?
Mulher 2 – Detesto também!
Homem – (ele pára de dançar) Peraí, mas você tá numa micareta!
Mulher 2 – Pois é... É que tô fazendo um estudo antropológico sobre a “Micareta e o processo alienatório como forma de suportar a dura realidade brasileira”. Eu trabalho de conclusão para a faculdade de Ciências Sociais.
Homem – (sem entender muito) Ah, tá!
Mulher 2 – Agora, desculpa, vou ter que ir, porque ainda tenho que coletar mais dados para o meu estudo.
Homem – Não quer tomar uma água de coco e trocar uma idéia? (ele olha de modo sedutor)
Mulher 2 – Tá me paquerando, é?
Homem – É que eu achei interessante a idéia desse estudo! Quem sabe, a gente não encontra umas afinidades aí. (ele toca no braço dela, fazendo um carinho).
Mulher 2 – Desculpa mesmo, mas não é ético eu me envolver com o objeto de estudo. O distanciamento garante a objetividade. E também não quero atrapalhar a sua micareta! Beijos, fui! (sai)

Homem – Atrapalhar a minha micareta? Eu mereço!

(sobe a música e a luz vai caindo. Afonso olha para os lados com cara de tédio)

FIM

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Cena de Motel

  Ufa, depois de séculos, volto ao meu bloguinho de textos para teatro, cinema e TV. Ele foi abandonado por uma boa causa. Trabalho demais, gente! Mas hoje volto com o texto que gosto muito e que ainda não foi encenado também. Espero que curtam! 

 

 

 Cena de Motel - de Raul Franco



Mulher – Então, o que vai ser?
Homem – Como?
Mulher - O que vai rolar?
Homem – (sem entender) A gente ‘tá num motel...
Mulher - Eu sei. Mas eu quero saber como vai ser.
Homem - O quê?
Mulher - O barato.
Homem - Barato?
Mulher - É, como a gente vai desenrolar.
Homem - Olha, eu não sei se eu bebi de menos, mas eu não tô entendendo.
Mulher - É simples. Eu só preciso saber como vai ser o percurso da nossa transa.
Homem - Porque a gente não começa, aí você vai saber.
Mulher - Comigo não rola assim. Eu gosto de saber antes, até pra ter tudo na cabeça e depois executar. Desculpa, mas eu sou super-metódica e super-organizada.
Homem - A gente só vai fazer sexo.
Mulher - Eu sei, Paulo. Mas não é porque é sexo que tem que ser desorganizado.
Homem - Olha aqui, eu só quero transar.
Mulher - Então, vamos lá. Qual vai ser o seu percurso: boca, seio e vagina?
Homem - Hein?
Mulher - Tem gente que faz vagina direto, depois boca, seio e, se der, um pescocinho.
Homem - Não seria melhor a gente começar pra ser mais espontâneo?
Mulher – Vem ce, você curte preliminares?
Homem - Claro.
Mulher - Claro o quê?
Homem - Claro que eu curto. Eu gosto de preliminares.
Mulher - Quanto tempo?
Homem - O quê?
Mulher - As preliminares.
Homem - 10 minutos?
Mulher - Tá! Me engana que eu gosto. Meu filho, preliminar assim, de dez minutos, só em filme da Meg Ryan.
Homem - Pô, achei que a gente vinha pra cá pra transar.
Mulher – Transar?! Você não quer transar.
Homem - Claro que quero.
Mulher - Você quer trepar, que eu sei.
Homem - Não é a mesma coisa.
Mulher - Pior que não. Transar é uma coisa mais como jogo, como uma curtição gostosa. Mulheres até transam. Agora homens gostam mesmo é de trepar, como se a mulher fosse uma árvore, uma escada. Trepar já deixa implícito que um dos dois é subjugado. Você tem cara de trepador.
Homem - Tenho?
Mulher - Confessa. Não gosta de trepar.
Homem - É...
Mulher - É o quê?
Homem - Eu gosto.
Mulher - De quê?
Homem - Disso.
Mulher - Fala pra mim. Eu quero ouvir.
Homem - Eu gosto de... (fala de modo inaudível) trepar.
Mulher - Eu não ouvi.
Homem - (fala de novo de modo inaudível) Eu gosto de trepar.
Mulher - Grita pra me convencer.
Homem - Eu gosto de trepar, porra!
Mulher - Então, pega um banquinho e trepa porque eu não gosto de trepar. Eu transo. Faço amor. Trepar nunca.
Homem - Olha, vamos começar logo. Esse motel é caro pra caramba e a hora já tá passando.
Mulher - Eu não me importo com o tempo.
Homem - O que você quer, então?
Mulher - Quero saber: boca, vagina e seio ou vagina, seio e boca, ou seio, boca e vagina?
Homem - Bunda.
Mulher - Hã?
Homem - (com raiva) Eu começo pela bunda. Pode ser?
Mulher - Não começa a ficar com raiva, não. A gente só se conhece há três dias. Raiva é só com o tempo.
Homem - Já vi que não vai rolar.
Mulher - Sabe que eu adoro sexo verbal?
Homem - Pô...
Mulher - É bacana. Seguro. Não tem perigo. Do jeito que as coisas estão, é a melhor forma.
Homem - Eu gosto de meter.
Mulher - Meter, meter, meter. Penetrar é mais poético.
Homem - (raiva) Eu gosto de enfiar.
Mulher - Enfiar é chulo.
Homem - Foda-se.
Mulher - Foda-se é masturbação.
Homem – Ah, não enche!
Mulher - Quantos centímetros?
Homem - Hã?
Mulher - Fala aí. Teu pênis mede quanto?
Homem - Por que você não deixa eu pôr pra fora e aí você vê?
Mulher - Porque eu estou sem fita métrica, não tenho como precisar.
Homem - Nunca medi.
Mulher – Mentira! Todo homem mede o pau, assim como toda mulher pega um espelhinho pra ver a sua vaginazinha por dentro.
Homem - Não sabia dessa.
Mulher - Pois fique sabendo. Mas e aí, é grande ou pequeno?
Homem - Vai ficar na curiosidade.
Mulher - Já vi que é pequeno.
Homem - 19 centímetros, pronto.
Mulher - Ainda há pouco não tinha medido e agora é 19. Nossa! Deve ser 17, fala sério! Você roubou aí dois centímetros, confessa.
Homem - Não roubei nada. É 19, já disse.
Mulher - Fino ou grosso.
Homem - Grossão.
Mulher - Ih... Não vai dar. Eu sou muito apertada.
Homem – E daí? Já vi que não vai rolar nada mesmo.
Mulher - Você é acima da média dos brasileiros, né? A média não é entre 13 e 15?
Homem - Não sei.
Mulher – (mudando de assunto) Você já imaginou quantas pessoas já passaram por aqui? Milhares. Devia estar escrito na porta dos quartos: bem vindo, você é o visitante número mil e tal. Cê não acha?
Homem - Pra quê?
Mulher - Pra ter uma idéia. Também podia estar assim: aqui já foram contabilizados 910 orgasmos. Não seria legal?
Homem - E como iriam saber isso?
Mulher - Quando você entregasse a chave do quarto na saída, o cara devia perguntar: foram quantos orgasmos? Aí, você responderia: 2. Aí, ele: boa noite e voltem sempre. Olha que barato!
Homem - Aretuza, você pode me dizer uma coisa?
Mulher - Digo.
Homem - A gente não vai trepar, né?
Mulher - A gente pode...
Homem - Por favor, não venha com gracinha. Responde.
Mulher - Sinceramente?
Homem - Fala.
Mulher - Eu tô naqueles dias.
Homem - Você tá... menstruada, é isso?
Mulher - Não. Eu tô naqueles dias em que a mulher tira para infernizar a vida dos homens, provando que eles são apenas cachorrinhos babões!
Homem - Você tá brincando com a minha cara, é isso?
Mulher - Na verdade, eu tô.
Homem - O quê?
Mulher - Você foi o escolhido para participar da pegadinha do IBGE. Olhe para a câmera que está ali no alto e sorria.
Homem - Pegadinha do IBGE? Que porra é essa?
Mulher - Sim, pegadinha do IBGE que comprova a estatística enorme de que o sexo só acontece quando a mulher permite. Ou seja, a mulher é quem decide sempre com quem e o momento de fazer sexo. O homem, por outro lado, transa a qualquer momento, desde que encontre alguém que estale o dedo pra ele. Obrigada pela sua participação e até a próxima.
Homem - Peraí. E a gente não vai trepar?
Mulher - Aí, não pode. As câmeras do IBGE não podem captar imagens assim de um sexo voraz.
Homem - Se você quiser a gente faz um sexo delicado.
Mulher - Pois é, eu não quero. Desculpa. Hoje não vai dar. Tô com uma dor de cabeça terrível. Mas toma esse cartão.
Homem - O que é isso?
Mulher - O número de uma casa de prostituição. Liga pra lá. Lá é o único lugar em que o homem decide a hora de ter sexo. Agora, deixa eu ir, porque tenho que dar continuidade a pesquisa. Bye! Ah, deu 69 reais a sua conta. Vai pagar com cheque ou cartão?


FIM


terça-feira, 3 de maio de 2011

O amor é um bicho estranho!

Olá! Se você notou, sexta não teve texto, nem segunda. Mas hoje tem texto novo no blog. Agradeço aos 5 seguidores desse blog que, com certeza, sentiram falta de novos esquetes.

Hoje, mergulho no bom e velho tema das relações de casais. Com vocês: O AMOR É UM BICHO ESTRANHO.






O AMOR É UM BICHO ESTRANHO, de Raul Franco

Casal se encontra deitado numa cama. ela lê um livro. Ele olha para o teto. Por enquanto a luz ilumina os dois igualmente. De repente, a luz vai aos poucos ficando mais intensa nele. Ouve-se o seu pensamento. Depois, se ouvirá o pensamento dela. A luz sobre ela ficará mais forte, enquanto a dele diminuirá e assim por diante. Música calma toma conta do ambiente.

Pensamento dele - Eu e a Kátia já temos cinco anos de namoro. Estamos praticamente casados. Ainda pouco, fizemos amor. E, pra ser sincero, não me agradou muito. É que a Kátia sempre faz as mesmas coisas, não muda nunca. Repete o mesmo percurso em toda transa. Podia, ao menos, desviar um pouquinho ali, um pouquinho acolá. Mas não. Sempre o mesmo trajeto. Eu sou a estrada. E ela, um carro usado que precisa ser muito bem empurrado para andar. (ele olha pra ela e sorri)

Pensamento dela - Olha o idiota aí! Fica o tempo todo me olhando e sorrindo. Deve ter se achado o máximo na cama. Mas ele não é essa fogueira toda. Tá mais pra palitinho de fósforo. E quer saber? Eu apago esse fósforo rapidinho pra poder ficar lendo. Quer dizer, lendo não. Segurando o livro pra pensar no tédio que é a minha vida. (ela olha pra ele que sorri. ele retribui, meio sem vontade)

Pensamento dele - É tão bom olhar pra essa otária e ri dela. Ela deve pensar que eu tô super feliz ao lado dela. Mal ela sabe que eu vivo é pensando na Clara, aquela gostosa do trabalho que só vai de sainha e blusinha colada... um tesão de mulher! Se ela me estalasse o dedo, eu já estaria com ela... (olha para Kátia e ri) Olha a cara de inocente dela. Nem sabe o que eu penso. Que coisa boa pensar! A gente zomba dos outros em silêncio.

Pensamento dela - Um dos melhores momentos do meu dia é quando o Rubens vai pro trabalho. Já estou achando um saco esse negócio de dormir com o namorado. Maldita hora em que eu fui me mudar pra cá. Agora sou obrigada a acordar todo o dia e sentir a fedentina que sai da boca desse infeliz. Fora a roncadeira noturna. Não há tesão que resista.

Pensamento dele - Essa mulher aí tem mania de dar uns tapas na minha cara quando dorme. Fico me desviando durante a noite toda. Acordo cansado e roxo. Deixa essa coisinha fechar esse livro para ouvir o que eu vou dizer pra ela antes de dormir.

Pensamento dela - Eu sei que quando eu fechar esse livro, o Rubens vai querer me dizer alguma coisa idiota. Então, vamos lá, encarar esse idiota. Espero que ele diga alguma coisa que mude a droga da minha vida e me tire dessa rotina absurda em que eu fui me enfiar. (fecha o livro com uma certa força e boceja. puxa o lençol para se cobrir) Um, dois, três... ele vai falar.

Rubens - Kátia...
Pensamento dela - Não disse? (vira-se pra ele e responde)
Kátia - Oi?
Rubens - (carinhosamente) Eu te amo muito!
Kátia - (carinhosamente) Eu também, amor.

Eles se beijam. Luz cai. FIM.